
Foi exatamente assim que a ideia foi vendida à sociedade nos últimos anos. O Brasil tem impulsionado com força a conversão do transporte público para eletricidade — hoje, uma parcela crescente da frota urbana já é elétrica, especialmente nas grandes metrópoles, com metas ambiciosas de eliminar completamente o diesel nos próximos anos. Mas, na prática, as coisas se mostraram bem mais complicadas.
O problema que ninguém quis mencionar
Vamos começar por um fato simples que foi ignorado por muito tempo: os ônibus elétricos são consideravelmente mais pesados que os convencionais. Um ônibus urbano a diesel típico pesa em média cerca de 12-14 toneladas, enquanto um elétrico pode chegar facilmente a 18-20 toneladas. A diferença é enorme e representa uma carga real sobre as vias e a infraestrutura ao redor.
Muitas cidades não estavam preparadas. O asfalto, a base das ruas e as construções antigas ao longo das linhas foram projetados para cargas bem menores.
Vibrações no lugar do silêncio
Paradoxalmente, em vez do esperado "silêncio e tranquilidade", moradores de vários bairros começaram a reclamar de vibrações constantes. O efeito é especialmente forte em trechos com lombadas ou buracos.
O pesado pacote de baterias gera impactos que se transmitem ao solo e aos edifícios próximos. A sensação é parecida com morar ao lado de uma linha de VLT, mas sem trilhos. E, diferente de veículos mais leves, esses ônibus aceleram o desgaste do pavimento.
Cidades onde o problema ficou evidente
Um exemplo claro aparece em regiões de São Paulo e Rio de Janeiro, onde moradores relataram maior vibração e deterioração mais rápida das ruas. Em alguns corredores, ao substituir temporariamente os elétricos por modelos a diesel mais leves por motivos de manutenção, as vibrações diminuíram sensivelmente; quando os elétricos voltaram, o problema retornou junto.
Estudos em rotas de Belo Horizonte e Curitiba apontaram que esses ônibus afetam o descanso noturno dos moradores — um tema sensível em áreas urbanas densas.
A resposta das autoridades — e as dúvidas que ela gera
Em algumas cidades, as autoridades minimizaram a questão, alegando que os veículos em geral estão ficando mais pesados e que não há nada de extraordinário. Parece lógico na teoria, mas na prática soa como uma tentativa de desviar do problema.
Sim, os carros particulares vêm ganhando peso gradualmente. Mas não adicionam toneladas de um dia para o outro. Com os ônibus, foi exatamente isso que aconteceu: por decisão administrativa, e não por evolução natural da tecnologia.
A conclusão que se impõe
O problema não está na tração elétrica em si. Ela pode ser uma ótima solução onde realmente se encaixa. O problema está na abordagem dogmática: "elétrico é sempre melhor, não importa o contexto".
As experiências em cidades brasileiras mostram claramente que, ao ignorar efeitos colaterais e condições reais de operação, podemos criar novos problemas no lugar dos antigos. Às vezes, o mais sensato é parar, reconhecer o erro e ajustar o rumo. A questão é se as autoridades estão dispostas a fazer isso — ou se vão continuar fingindo que tudo está bem.